segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Olhe para quem te acolhe, nunca mendigue atenção


                                               Miguel Nenevé e Vera Flores

Enquanto  observamos o fluir das águas amazônicas, às vezes meio revoltas, às vezes mais calmas, provocando um sussurro com seu movimento em direção ao mar ou para um rio, podemos observar a vida a correr, fluir, passar em busca de algo a mais....Assim, se enlaçam os relacionamentos sejam eles amor ou amizades. Fluir como o rio é contornar obstáculos que surgem em nossa vida, é desapegar-se do que nunca deveríamos ter nos apossado, é levar conosco o que nos pertence e deixar se for necessário. É permitir que alguém entre em nossa vida e esteja livre para sair.
O rio nos faz ficar pensando sobre o apego, sobre pessoas, sobre o amor, amizade e liberdade de fluir como as águas. Centramos nossa reflexão no apego, porque de certa forma já vivenciamos isso. Quem não teve problemas para deixar que as águas fluíssem ? Temos às vezes dificuldades em promover  o  “Des-apego”. Desapegar-se é desenvolver-se emocionalmente rompendo os vínculos que nos limitam; é tomar consciência de que a minha felicidade não depende do outro. Sentir a necessidade de ter o reconhecimento de outras pessoas é um tipo de apego chato, e vai colaborando para perdermo-nos de nós mesmos.
O apego, portanto, pode ser justamente esta dificuldade de deixar fluir, esta vontade de segurar a água, isto é, algo que deve ir, esta luta para que as águas não fluam como deveria ser. Pode ser o deslumbre por algo ou por alguém. Ficamos numa situação em que insistimos em preencher vazios com a vida de outra pessoa sem perceber que precisamos descobrir em nós mesmos o que nos falta. As expectativas criadas em relação à outra pessoa podem gerar frustrações, com certeza. 

Por isso neste caso, estamos nos referindo especificamente ao apego a alguém, a uma pessoa.  Às vezes, admiração exagerada a quem quer que seja leva-nos a não perceber que as águas devem fluir para outros lados, faz-nos cegos a nós mesmos e ao nosso fluxo de vida. Isso pode acontecer em casos de querermos suplicar e até mendigar uma atenção. Toda vez que isso acontece, sem dúvida, há uma submissão, que se torna um obstáculo no curso normal da nossa vida.
Sabemos que ninguém é inferior a ninguém, que todos são iguais, que todos têm sua qualidade, que cada um tem o seu curso, que cada um pode ser comparado a um rio que desliza para o mar. Sim,  isso todos sabemos. Por uma lógica perversa, no entanto, por um ato inconsciente, muitas vezes a pessoa de quem pedimos atenção se julga superior e acaba menosprezando-nos, julgando-nos sob seu domínio e diminuindo nossa capacidade de pensar, de agir, enfim cegando-nos às nossas qualidades e até à nossa inteligência.

Ninguém pode nos menosprezar tanto quanto nós mesmos. Além disso, parece ser uma característica do ser humano  desprezar quem lhe super valoriza, de invalidar quem ele toma como certa uma dependência. Tomar como garantida uma atenção ou uma dependência pode levar-nos a desprezar a atenção, os favores e tudo o mais que recebemos da outra pessoa. A pessoa que acaba se julgando “superior” por solicitarmos sua atenção vai sempre mostrar indiferença para conosco. 
Insistir em querer ser prioridade na vida de quem nem consideração nos oferece , solicitar ou até mendigar atenção desta pessoa, com certeza só pode alimentar mais ainda  o desprezo da pessoa por nós. E isso pode nos afundar na baixa auto-estima. Lembremos o que  dizia Carl Sandburg,“ O tempo é a moeda da sua vida. É a única moeda que você tem, e só você pode determinar como ele será gasto. Tenha cuidado para não deixar outras pessoas gastá-lo por você”. Por isso, desapegue de quem já não te dá atenção, deixe o rio fluir (deslizar)... luir (acenar)