domingo, 21 de agosto de 2016

Chove em Curitiba

nada de novo, eu sei
mas meu coração regado
de lembranças de ti,
é notícia de última hora.

o frio e a solidão
aquecem
minha imaginação
de tempos recentes
que não existia nada
entre eu e você
somente Nós.
Sobre a poeta P. K. Page, publicado já há algum tempo na Revista PRESENÇA, da Unviersidade Federal de Rondonia.

http://www.revistapresenca.unir.br/artigos_presenca/11miguelneneve_umacanadenseapaixonadapelobrasil.pdf


REVISTA DE EDUCAÇÃO, CULTURA E MEIO AMBIENTE- Març.-N° 11, Vol I, 1998 1

 UMA CANADENSE APAIXONADA PELO BRASIL: UMA LEITURA DE THE BRAZILIANJOURNAL DE P. K. PAGE K. PAGE Miguel Nenevé * Miguel Nenevé *

 Resumo: Diferente dos livros de literatura de viagem que apresentam o país estrangeiro com olhos imperiais minimizando a terra e o povo que vive ali, Brazilian Journal convida o leitor a ler o Brasil através de um olhar curioso e poético. Cada momento oferece uma nova descoberta, uma nova visão de beleza. Embora o livro seja em forma de diário, a autora não fala muito dela mesma, mas do Brasil cheio de alegria e beleza visto com olhos poéticos.

 Palavras – Chave : Beleza, Descoberta, Diário e Poético.

Abstract : Unlike travel literature books that present the foreign country with eyes Imperial minimizing Earth and the people who lives there, Brazilian Journal invites the reader to read the Brazil through a curious look and poetic. Every moment offers a new discovery, a new vision of beauty. Although the book is shaped like a diary, the author doesn't speak much herself, but do Brasil full of joy and poetic beauty seen with eyes. KeyWords: Daily Beauty, Discovery, and Poetic.


Em 1957 a canadense Patrícia Kathleen Page veio ao Brasil para acompanhar o marido Atrhur Irwin que fora nomeado embaixador do Canadá. P.K. Page já era reconhecida como poeta no Canadá, tendo inclusive recebido prêmio pelo livro The Metal and the Flower. Chegando ao Rio de Janeiro a então capital brasileira, Page iria se encantar com o Brasil. Ali era pararia de escrever poesia para retornar somente dez anos depois. Mas no Brasil ela começaria a pintar. No Brasil também ela escreveu um diário que serviu de base para o livro

 REVISTA DE EDUCAÇÃO, CULTURA E MEIO AMBIENTE- Març.-N° 11, Vol I, 1998 2

Brazilian Journal. Embora classificado como literatura de viagem, a obra contém muita linguagem poética e agradável. Neste artigo pretendo explorar Brazilian Journal como uma declaração de amor ao Brasil. Diferente dos livros de literatura de viagem que apresentam o país estrangeiro com olhos imperiais minimizando a terra e o povo que vive ali, Brazilian Journal convida o leitor a ler o Brasil através de um olhar curioso e poético. Cada momento oferece uma nova descoberta, uma nova visão de beleza. Embora o livro seja em forma de diário, a autora não fala muito dela mesma, mas do Brasil cheio de alegria e beleza visto com olhos poéticos. Quando fala de nossa beleza natural, por exemplo, ao descrever a praia de Ipanema: "The beach was beautiful --- Slightly hazy. Black, Brown, White Brazilians in futebol sweaters, kicking the bal about in the thick, soft, sand;" (A praia está linda --- levemente brumosa. Pretos, mulatos e brancos brasileiros em camisa de futebol chutando a bola na areia grossa e macia.) Percebe-se então que a prosa de Page carrega a sensibilidade poética revelada em muitas ocasiões. Falando de Florianópolis, a autora diz: "A lovely drive. Ali along the beautiful coast tumbling, tangling vegetation, sweeping beaches, little island and great smooth round stones in the sea... (Uma viagem maravilhosa. Sempre ao longo do lindo litoral --- vegetação emaranhada e revolta, praias se arrastando, pequenas ilhas e grandes pedras lisas e redondas no mar). Como na sua poesia, no Journal, os passarinhos também aparecem freqüentemente "pulando de alegria". As palmeiras do Brasil por sua vez, muito "esbeltas e elegantes". A observação da beleza natural, no entanto, não faz com que a escritora deixe de perceber o povo que ali habita sua cultura e seu viver. Ela revela ter uma mente aberta e sem preconceito para admirar o jeito de ser dos brasileiros. O seu reconhecimento de sua condição de "outsider" é importante para que ela nunca faça generalizações e julgamentos que possam diminuir o valor do povo que aqui vive. “Portanto, mesmo revelando-se um pouco colonialista ao apresentar o Brasil como ‘um paraíso tropical”, a autora está longe de julgar o país com olhos "superiores" como era muito comum a escritores de viagem nessa época. Page revela uma grande disposição para aprender sempre mais, ouvindo o povo, participando de tudo o que pode para poder imergir-se na cultura brasileira. Assim, o povo brasileiro desempenha importante papel em seu livro. Logicamente que sendo uma mulher de embaixador, o primeiro contato que autora tem com o povo brasileiro ficam restritos aos seus empregados e autoridades políticas. Seu interesse em conhecer o país, no entanto, faz com ela visite museus e igrejas cheios de arte onde ela aprende um pouco da história e cultura brasileira. Ela fica conhecendo famosos artistas já falecidos e vivos. Não pode esconder, por exemplo, sua admiração por Portinari que ela "cumprimenta com um tipo de olho especial" . A autora também ouve música brasileira, vê nossos filmes e comenta sobre eles, vai a estádio de futebol para se entusiasmar com todo o movimento que permeia uma partida de futebol. Ao lermos o seu livro podemos perceber que sempre que possível ela estava conversando com as pessoas e aprendendo sobre o Brasil. O seu interesse em aprender o nosso idioma logo no início revela sua vontade de imergir-se melhor em nossa cultura. Diferentemente de outros estrangeiros vivendo no Brasil naquela época, ela logo começa a usar o português em todas as ocasiões. Na realidade ela critica estrangeiros que passam anos aqui sem interesse em aprender nossa língua e nossa cultura. Page critica, por exemplo, os americanos que vêm ao Brasil só pelo trabalho e lucro, mas que depois de muitos anos não têm aprendido nada sobre o Brasil: "Next Day another session of the North American community. Very, very tiresome. It's as if they have no eyes. For them Brasil is nothing but a series os smells - ali unpleasant!"(No próximo dia outra sessão com a comunidade norte-americana. Muito, muito cansativa. Parece que eles não têm olhos. Para eles o Brasil não é nada mais que um cheiro desagradável!). O leitor pode sentir que às vezes a autora trata o Brasil como se fosse seu próprio país sentindo-se ofendida com aqueles que o olham como se fosse uma terra de povo inferior. Em outra ocasião, por exemplo, ela critica o espírito colonizador de um empresário britânico no Rio Grande do Sul: "Our Brites hosts were astonishing by everything. They had lived there twenty three years as if on the point of returning "home" and so had taken little interest in the local people or sights. The manager's wife, in fact spoke hardly a word of Portuguese..."(Nossos hóspedes britânicos estavam assustados com tudo. Eles tinham vivido ali vinte e três anos já quase retornando para "casa" e tinham tido pouco interesse no povo e na paisagem local. A esposa do gerente falava malmente algumas palavras em Português). Depois de ouvir dos britânicos que no Brasil não há nem crânio nem energia suficiente para dirigir uma empresa, a autora reafirma sua repulsa contra atitude colonial dos britânicos emo que uma grande percentagem de britânicos tenha esta atitude em relação ao Brasil". Ela lembra depois que esta atitude não é encontrada somente entre britânicos, mas também entre canadenses. Ela diz que no escritório canadense havia um estenógrafo que desprezava os brasileiros "que nem eram brancos". Quando a autora teve que fazer uma cirurgia, a estenógrafa diz: "Estou surpresa que você não fará a operação em casa. Deve ser horrível pensar que tem que ir a um hospital brasileiro." Depois de relatar isso, a autora faz a sua conclusão: "O preconceito não morre com facilidade". Brazilian Journal fornece ao leitor uma série de comentários que mostram como o autor se opõe à visão que considera um povo como inferior ao outro. Seu livro revela que há muitos estrangeiros que detestam o Brasil, mas vivem aqui por que aqui está seu "Bread and butter" ou por que aqui há lucro melhor do que "em casa". Muitas dessas pessoas com mente colonizadora não seriam nada "em casa", mas aqui num país economicamente inferior, julgam-se superiores aos brasileiros. Até a atitude do ministro canadense para Assuntos Externos é criticada. Sobre ele, em visita ao Brasil, Page diz: "Eu suspeito que ele se deu melhor aqui do que em seu país onde a gabolice conta menos". A mulher do ministro por sua vez não demonstrou nenhum interesse pelo Brasil e provavelmente "não pode aprender nada sobre o Brasil". Este amor de Page pelo Brasil, no entanto não é ingênuo. A autora observa o país com mente aberta, sem preconceito, mas o critica também quando acha necessário. Por exemplo, ela denuncia o fato de nunca ter visto um negro em festa social. A má distribuição de renda também não lhe agrada. Infelizmente, diz ela, o Brasil tão alegre forma "um mundo onde os ricos são muito ricos e os pobres muito pobres". Esta crítica não significa que ela se julga na posição de julgar o país ou tratar como inferior ao Canadá. Pelo contrário, quando fala do povo Brasileiro ela confessa que ele é mais alegre e mais festivo e mais livre que o canadense. Amando a cultura do país, admirando o seu povo, reverenciando a sua natureza Page iria viver sempre mais a sua brasilianidade. Quando ele recebe a notícia que terá que deixar o país em 1959 por causa da transferência de seu marido para outro posto diplomático, ela proclama que não tem "nenhuma vontade de sair". Mais tarde ela diria: "porque nós somos brasileiros". Pode-se dizer, então, que Brazilian Journal é uma obra importante da
literatura canadense sobre o Brasil no tempo de Juscelino Kubitscheck. Todo o brasileiro que estuda literatura canadense ou brasileira como também história e cultura brasileiras, deve conhecer esta obra. É aqui que Page teve a experiência de liberdade e a "visão de beleza" como ela diz. Ela deixou o Brasil em  1959, mas o Brasil não deixou jamais a sua mente. Em sua poesia e prosa posterior o Brasil estará sempre presente. Escrevendo para mim em maio de 1997 a autora diz: "Indeed, my Brazilian Journal was a declaration of Love. I was very happy in your country and filled to the brim with the beauty" (De fato minha obra Brazilian Journal foi uma declaração de amor. Eu fui muito feliz em, seu país. Eu fui completamente inundada pela beleza).

*Miguel Nenevé. Professor Doutor do Departamento de Letras da UFRO.



 REVISTA DE EDUCAÇÃO, CULTURA E MEIO AMBIENTE- Març.-N° 11, Vol I, 1998 5