sábado, 15 de fevereiro de 2020

Artigo publicado na Revista Igarapé

“THE PARROT AND DESCARTES”: A FORMAÇÃO INICIAL DO PROFESSOR DE LÍNGUA INGLESA E A IMPORTÂNCIA DA SUBJETIVIDADE

por ;  Lusinilda Carla Pinto Martins Universidade Federal de Rondônia (UNIR)                                                                                                   E-mail: lcarla22@gmail.com

 Miguel Nenevé Universidade Federal de Rondônia (UNIR)                                                                                                                                  E-mail: neneve@unir.br

RESUMO:
 Neste estudo propomo-nos a discutir questões de subjetividade versus a objetividade na formação inicial de professores e na “Prática de Ensino” de uma língua estrangeira, principalmente o Inglês, no Brasil. Partindo de um conto intitulado “O Papagaio e Descartes” da escritora Guianense Pauline Melville, exploramos a necessidade de se repensar o “cartesianismo” e o racionalismo quando falamos em dados sobre formação de professores de inglês. Infelizmente o cartesianismo e o objetivismo têm influenciado nossa percepção e nossa avaliação sobre o que é “bom” e “ruim”, o que é considerado digno de ser aceito como “verdade” ou não. Muitas vezes, lamentavelmente o que é local, o que é subjetivo é considerado indesejado. Estudiosos brasileiros, tais como M. J. Coracini e Souza (1991), I. L. Araújo, I. L (2003) e o australiano póscolonial Bill Ashcroft (2008) dão suporte a nosso argumento.

 Palavras-chave: Educação; Subjetividade; Objetividade; Ensino de línguas estrangeiras.

 ABSTRACT:

 In this paper we propose to discuss the issue of subjectivity versus objectivity in the teaching practice of foreign language, especially English, in Brazil. Starting from the short story “The Parrot and Descartes” by Pauline Melville, we argue that Cartesianism has influenced a view on Education which tends to consider good and valuable what is “scientific” and “objective” and “universal”. The subjective, the local seem to be considered undesirable and unreliable. Brazilian scholars on the Education field, such as Coracini and the Australian postcolonial critic Bill Ashcroft (2008) are important support for our argument. Keywords: Education; Subjectivity; Objectivity; Foreign Language teaching

INTRODUÇÃO

 Em uma placa de informação para turistas na Universidade Federal de Rondonia, conhecida por UNIR, desde a sua fundação em 1982, encontramos a informação em inglês: “Universidade Federal de Rondônia – UNITE was founded....” O fato de traduzir UNIR – literalmente demonstra como se desconsidera o local, a história, o sujeito. Isso é, infelizmente mais comum do que se pensa. Quando nos referimos à língua estrangeira parece que logo temos que pensar em algo totalmente racional, cartesiano, universal em que devem ser esquecidas todas as particularidades, onde tudo tem que ser objetivo, racional e cartesiano. Não se considera as particularidades, do local, da historia do sujeito, das suas particularidades. Neste caso de nosso exemplo, o fato de a tradução ser feita por uma empresa de fora da cidade, contou muito. Pensou-se de uma forma cartesiana, racional considerando que o verbo unir traduz-se por “Unite” então a UNIR, instituição também é “Unite.” Não se considerou que UNIR é um nome, que neste caso é um substantivo e não um verbo. Apagaram-se o contexto, a história e toda a subjetividade. Neste artigo gostaríamos de discutir a importância de se pensar a subjetividade quando pensamos em língua estrangeira, em ensino, e também em formação de professores. Consideramos que haja a necessidade, primeiramente, de explorarmos o tema “subjetividade.” Acreditamos que é muito relevante, mesmo reconhecendo que hoje não se concebe mais a matematização do conhecimento nem a institucionalização de verdades inquestionáveis, explorar questões referentes ao cartesianismo em relação à subjetividade. Diferente do professor Gradgrind do livro de Charles Dickens, Hard Times (1990), acreditamos que precisamos ir muito além de “fatos” quando se fala em educação e formação de professores de língua estrangeira.

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 CARTESIANISMO E OBJETIVIDADE VERSUS SUBJETIVIDADE NA PESQUISA E NO ENSINO Na evolução do pensamento científico, a noção de cientificidade se configura com base na objetividade e na neutralidade. O empirismo lógico e o modelo cartesiano de ciência instituíram uma concepção de objetividade marcada respectivamente pela prova do intelecto e pelas provas dos sentidos.1 O Cartesianismo surgiu com a importante obra do francês René Descartes, cujo título original “Discours de la méthode pour bien conduire sa raison, et chercher la vérité dans les sciences” sugere que este era o método de conduzir corretamente nossa razão, na procura da Verdade nas Ciências. Importante lembrar que o livro foi publicado em 1637, período em que a Europa estava saindo para outras terras, conquistando povos, colonizando terras não europeias. Isso certamente ajudou a fomentar a ideia que a Europa poderia levar para suas colônias, em sua “missão civilizadora, o método de conduzir corretamente a razão e logicamente combater tudo o que não dizia ao mundo europeu e que era irracional. Trabalhando sob uma crença humanística, a ideia central era que o ser humano, apesar de suas diferenças, tinha uma natureza universal recebida de Deus, Rene Descartes ao escrever isso em 1619 de certa forma estava tentando fazer sentido do mundo, e querendo explicar o que todos os humanos sabem com certeza. Neste aspecto podemos dizer que filosofia cartesiana colocou os seres humanos europeus no centro de seu mundo e permitiu que eles acreditassem que a natureza podia ser controlada por meio da aquisição de conhecimento, a classificação e a análise de seu mundo circundante. Simplificando, poderíamos dizer que esta maneira de ver o mundo favoreceu a crença de que o europeu era o universal e vice-versa. Desta forma este “pensamento científico” reforça, a noção de que as particularidades de outros mundos, outras percepções de verdade ou 1 A concepção de objetividade apresentou-se sob duas facetas distintas; a prova do intelecto e a prova dos sentidos. No primeiro caso, conhecer significaria penetrar pela razão na “verdade” dos seres e fenômenos naturais. (...) no segundo caso, o da prova dos sentidos, a base do conhecimento estaria na concepção de que a verdade dos fatos só poderia ser atingida pelos sentidos: era o método indutivo por excelência. (Coracini, 1991, p. 26) _________________________ ___________________________ Igarapé, v. 11, n. 1, 2018, p. 179-199. 182
 poderíamos dizer, subjetividade, não devem ser consideradas, pois podem até ser nocivas ao processo de produção do conhecimento. Portanto, sob esta perspectiva não se deve falar de seu mundo, mas receber a verdade racional, cartesiana, indiscutível. O pensador e crítico pós-colonial australiano Bill Ashcroft (2002) explica que a separação cartesiana do sujeito e do objeto, a separação da consciência do mundo do qual se é consciente é o esquema que ainda guia a episteme do mundo ocidental, com sua obsessão pelo “científico”, pela objetividade com sua tendência a ver o mundo a continuação de dados tecnológicos (Ashcroft, 2002: 67). Esta visão de mundo nega, exclui ou suprime tudo o que não é ocidental, todo o conhecimento que foge de um padrão preconcebido. Neste contexto se formos mais além, podemos induzir que a filosofia cartesiana produziu maneiras de perceber o mundo que posiciona o europeu branco (colonizador) como o centro do mundo tendo a responsabilidade de educar o outro, o ignorante, de trazer para a racionalidade, para o “progresso” aquele que caminha em outro ritmo, que vê o mundo sob outra perspectiva. No conto “The Parrot and Descartes”, presente no título deste artigo, a escritora britânica, nascida na República da Guyana, satiriza esta percepção cartesiana que faz com que a Europa separe o conhecimento científico da magia, contrastando a visão de um papagaio de Orinoco com a de um pensador europeu, Descartes. A historia na realidade debocha do cientificismo europeu que não serve para explicar a realidade Ameríndia. Esta história da autora guianense serve para reforçar nosso argumento sobre o perigo de querer se tornar científico e racional e esquecer a subjetividade em nosso meio educacional. Estas correntes com tendências “cartesianas” e “objetividade” encontraram guarida no positivismo de Comte (1798) e no neopositivismo de Carnap (1891- 1970), que reforçam como critérios de cientificidade a objetividade e a neutralidade, em detrimento da subjetividade e dos valores (cf. ARAÚJO, 145). A ciência deve apoiar-se basicamente na realidade empírica e dotar-se de uma linguagem acerca de fenômenos que independe de juízos de valor, _________________________ ___________________________ Igarapé, v. 11, n. 1, 2018, p. 179-199. 183

finalidades e interesses, pois estes dizem respeito à subjetividade que é em tudo estranha a ciência. Sendo a subjetividade um empecilho a objetividade, que deve haver em qualquer proposição com pretensão científica, o mais seguro para a ciência é adotar o modelo da física e da química (ARAÚJO, 2003, p.145) Tal orientação, na área das ciências sociais e humanas, nos permite entender as bases da relação conflituosa entre objetividade/subjetividade. O pensamento científico positivista reforça, a partir de suas proposições, o mito de que a subjetividade é nociva ao processo de produção do conhecimento. A evolução do pensamento científico associa-se à adoção do método. Esta postura sistemática e racional proporciona um rigor metodológico e instaura a noção de cientificidade para o conhecimento. A concepção paradigmática de Kuhn desfaz esse padrão de racionalidade ao estabelecer que a adoção deste ou daquele paradigma (no momento da crise) não segue os critérios racionais da razão externa, neutra, atemporal e comum a teorias rivais. (cf. ASSIS, 1993, p. 138-139). Entretanto, ainda segundo Assis, é errôneo julgar que Kuhn propõe uma forma irracional na decisão entre paradigma, pois não há como pesar racionalmente todos os fatores a serem levados em conta na decisão de se abandonar ou não um paradigma, sob pena de acusação de inconsistência ou irracionalidade para quem não os admita. Compartilhamos com a abordagem de Kuhn de que ciência é o que a comunidade científica acata como tal e não um avanço em si mesma, como sugere Popper. No entanto, sabemos que as pesquisas do presente têm se mostrado cada vez mais frágeis diante dessa relação dialética. E tal fato tem gerado desafios que vão desde o reconhecimento de cientificidade e credibilidade das pesquisas na área das ciências humanas e sociais e, em especial, da área de Educação, à negação das ciências não naturais (sociais, humanas, etc.) como um campo possível de ser pesquisado.2 2 - Sobre esse assunto é relevante ler o texto de Jesus de Paula Assis (1993:133) que discorre sobre Kuhn e as ciências sociais e apresenta as razões pelas quais as ciências sociais têm usado em demasia e equivocadamente termos do modelo de Kuhn.
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 184 Bachelard (cf.1978, p.89-179) também aponta outro caminho para o conhecimento científico ao dizer que a ciência hoje se funda no projeto e situa-se, portanto, acima do sujeito e além do objeto. Para o autor, a dialética do pensamento científico contemporâneo é mostrar a novidade essencial que lhe é própria. Nesse sentido, o autor postula que é necessário tomar a objetividade como uma tarefa pedagógica difícil e não mais como um dado primitivo, uma vez que o real científico está em dialética com a razão científica e por isso os ensinamentos da realidade só valem na medida em que sugerem realizações racionais. Pronunciando-se sobre a questão da neutralidade, é o próprio Kuhn (cf. 2006, p.270) que afirma não existir nem nas ciências naturais e nem nas ciências humanas um conjunto de categorias que seja neutro, reforçando aqui a importância da interpretação hermenêutica para as descobertas na área das ciências humanas. Também nessa direção, Azanha (1992, p.181) afirma que fazer pesquisa na área de educação, por exemplo, segue igualmente o percurso do fazer ciências em outras áreas do conhecimento:”[...] a prática científica, em qualquer campo, abrange atividades como a proposição de problemas, a construção de teorias ou hipóteses, a formulação de conceitos, a observação, a invenção de instrumentos, etc.” No entanto, esse mesmo autor observa que No âmbito dessa variedade há, evidentemente, um amplo espaço para a criatividade do cientista; por isso, seria uma simplificação falsificadora conceber a prática científica como um espaço onde as ações se reduzem sempre ao surgimento de regras. (AZANHA, p.181) Azanha nos chama a atenção para um elemento essencial da prática científica, o sujeito pesquisador que deixaria a marca da subjetividade no fazer científico. Por isso ele critica a postura de um racionalismo excessivo adotada por cientistas anteriores, conforme podemos perceber no excerto: A esperança de Bacon e de Descartes e de seus epígonos na formulação de um método universal, cuja aplicação estrita garantiria o progresso da _________________________ ___________________________

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 185 ciência, revela-se como uma fantasia não realizada e provavelmente não realizável. O engano de todos aqueles que se empenharam nessa busca utópica foi o de imaginar que o modis operandi da ciência seriam redutíveis a um padrão formal de racionalidade. O núcleo desse engano foi a suposição de que a variedade das práticas científicas concretas teria algo de comum e essencial quando, na verdade, há entre elas apenas um “ar de família” . (AZANHA, 1992, p.182) O autor segue dizendo que tanto Bacon como Descartes construíram, em especial para o público leigo letrado, uma visão profundamente metodológica da produção do saber (cf. AZANHA, 1992 , p. 166) . A subjetividade passa então a ser entendida como “relatividade”, “dependência do seu construtor” (cf. CORACINI, 1991, p.36). E nesse sentido tornase indesejável e se constitui enquanto empecilho às pesquisas, em especial, às pesquisas sociais. Mesmo Nagel (1967), que atribui o mérito de uma pesquisa ao método científico que esta emprega, reforça que a objetividade não é consequência da Ciência, mas deve-se a uma comunidade de pensadores (cf. NAGEL, 1967, p.19- 20). O autor reconhece, pelo menos discursivamente, a manifestação da subjetividade na prática científica ao afirmar não somente que nenhum cientista é infalível e todos apresentam suas peculiares deformações intelectuais e emocionais, mas também que [...] qualquer significativa coleta de fatos, para fins de pesquisa é controlada por pressupostos de vários tipos, dependentes do cientista e não do assunto investigado” (NAGEL, 1967 p, 20-21). Coracini (1991, p.105), ao fazer um estudo sobre a subjetividade presente no discurso da ciência, observa que o discurso científico é largamente um discurso sobre as coisas, onde um ele não-humano é o sujeito de verbos de estado e de processo. A autora discute não apenas o mito da objetividade da ciência, mas a objetividade do discurso científico que se supõe neutro, imparcial e impessoal. Ela deixa claro que o ideal positivista de ciência rejeita a subjetividade na atividade científica, conforme podemos perceber no excerto abaixo: _________________________ ___________________________ Igarapé, v. 11, n. 1, 2018, p. 179-199. 186

 Como seria de se esperar em vista das convenções científicas, o sujeito enunciador assume, o tempo todo, a postura de um observador distante do objeto observado, como que provando, com sua ausência explicita, a ausência do sujeito pesquisador na etapa da investigação científica.(CORACINI, 1991 p.104) Discutindo a questão de como a cientificidade se configura em ciências não positivistas, Evangelista (1990) afirma que não existe a ciência, mas práticas científicas efetivas. Estas é que de fato acontecem, no entanto quem conglomera todo esse fluxo de práticas em uma unidade é a ciência. Por isso pontua que a ciência parece ser uma essência, ter uma vida própria, mover-se por si mesmo (EVANGELISTA, 1990, p.215). No seu entendimento, a ciência, ao diminuir a diversidade (fatos e fenômenos da realidade) e instaurar a unidade, conta com um sujeito cognoscente que assume uma posição neutra e nula frente ao objeto. No entanto, ao se deparar com ciências que têm como objeto algo que não pode ser consciente (a Psicanálise, por exemplo), o autor afirma que a cientificidade assume outra configuração. Por todo o exposto, observamos que objetividade e subjetividade são constitutivas do fazer científico e guardam sua positividade3 . A objetividade - marca maior da ciência clássica e aliada ao rigor e à precisão - nos proporcionou descobertas importantíssimas sobre o mundo em que vivemos. E a subjetividade, da mesma forma, impulsionou a ampliação e a criação de novos campos do conhecimento (ciências sociais e humanas) bem como desmitificou a prática científica, reconhecendo-a como uma atividade pautada não somente por regras a serem seguidas, mas guiada também pela criatividade do cientista. Não é intenção deste estudo priorizar nem a objetividade e nem a subjetividade na pesquisas científicas, mas fazer uma observação de que ambas são constitutivas da prática científica e que, portanto, não devem ser vistas pela ótica maniqueísta e nem tratadas de maneira excludente. Posicionamentos diferentes diante do mundo produzem conhecimentos diferentes e isto é produtivo para o campo do conhecimento. A natureza do objeto 3 No sentido atribuído por Foucault: de ser produtivo, de produzir saberes (cf. Foucault, 1979).
_________________________ ___________________________ Igarapé, v. 11, n. 1, 2018, p. 179-199. 187 define o tipo de pesquisa a realizar. Estaremos sempre nos defrontando com olhares diferenciados para o mundo, dando conta de diferentes e várias realidades e compondo, diferentes e várias verdades. Teremos sempre esse embate produtivo, querelas em torno da explicação de determinados fenômenos. Aprendemos com Kuhn e Popper que para haver progresso é preciso que teorias se enfrentem, se confrontem, sejam testadas, algumas abandonadas e outras eleitas. Não estaria aqui a finalidade de pesquisar, do fazer ciência? 2 A (INDESEJÁVEL?) SUBJETIVIDADE NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES Ao problematizar a forma de produzir e disseminar conhecimento na área educacional, Souza (2008, p.66) legitima nossa ideia de que a subjetividade se faz indesejável porque A Educação tende a expurgar o afeto e a considerar a dimensão subjetiva como propiciadora do erro e da falha nos processos de produzir e de disseminar conhecimento. De maneira geral a Educação adota a concepção do sujeito da razão plena capaz de controlar os afetos e de expurgá-los do processo psíquico e cognoscente de ensinar e de aprender. Nos termos da autora, esse pensamento cartesiano, linear e positivista de racionalidade tem promovido uma cisão entre processos que são recíprocos e relacionais: os processos de conhecer e de subjetivar. Souza (2008, p.65) nos lembra que, ao contato com novos conteúdos, situações e experiências, isto é, no processo de aprender, somos constrangidos a um trabalho cognoscente bem como a um trabalho subjetivo. Nas palavras de Souza (2008, p.64) O processo de conhecer se articula ao processo de subjetivar na medida em que o contato estabelecido com o real, seja para elaborar nossa capacidade cognoscente, seja para construir nossa subjetividade, é recíproco e relacional. Nesse sentido, a autora propõe, para o trabalho educacional, a presença de uma relação que possibilite aos participantes lidar com a dúvida e com os limites inerentes a aquisição de novos saberes e fazeres. (Souza, 2008, p.67). Tal pensamento vai de encontro ao que de fato acontece na prática. No entanto, o que comumente acontece, no processo de formação, é o adiamento da dúvida, dos
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 limites em detrimento do desejo de homogeneização . A subjetividade, assim, apresenta se indesejável. Em estudos anteriores, referentes à formação de professores de língua inglesa, por exemplo, já observávamos que o ponto nodal da Prática de Ensino, no curso de Letra-Inglês, ligava-se ao fato dessa disciplina formativa não encarar a heterogeneidade como constitutiva da formação do futuro professor (MARTINS, 1998). Os resultados de tais estudos mostraram que a Prática de Ensino de Língua Inglesa, ao abafar a heterogeneidade da/na sala de aula, escamoteava as contradições e os conflitos inerentes ao processo de formação, limitando-se à legitimação e à instrumentalização do professor de língua inglesa (cf. MARTINS, 1998, p.18). Nossos estudos nos levaram, naquele momento, à seguinte reflexão: A PELI4 , sob pena de perder o controle do processo de formação e porque determinada pelas regras do discurso pedagógico e institucional, que tendem a mascarar a heterogeneidade de todo discurso, procura abafar esses conflitos. Conflitos esses perpassados pelas relações de poder que se estabelecem na sala de aula. Dessa forma, essa disciplina busca transformar a sala de aula num espaço homogêneo para a aplicação de metodologias e para o desenvolvimento de atividades cognitivas.(MARTINS, 1998, p.91). Nessa perspectiva, observamos que toda ocorrência de heterogeneidade é “abafada” em nome da unidade e da homogeneização do processo de formação. O desejo de tal homogeneização também é captado por Josso (2002, p.199) no que diz respeito à noção de universalização do processo de formação expressa no excerto abaixo. A arte do tempo para o professor / formador não termina nesta gestão visível. Na sua programação, ele integrará, com maior ou menor felicidade, o que se sabe de si mesmo relativamente às suas energias disponíveis e aos seus diversos compromissos. Mas mesmo aí, a tarefa não está terminada, porque se sabe confrontado com a heterogeneidade do grupo e, logo , com as especificidades de cada aprendiz na atividade educativa. Cada professor/formador sabe disso e , no entanto, construímos os nossos cenários pedagógicos como se só tivéssemos de fazê-lo para um homem universal , espécie de protótipo ou de tipo ideal de aprendiz neste ou naquele período da vida. 4 - Prática de Ensino de Língua Inglesa. _________________________ ___________________________ Igarapé, v. 11, n. 1, 2018, p. 179-199. 189 Tomando como base todas as discussões referentes ao desejo de homogeneização do/no processo de formação, portanto, de exclusão da subjetividade, podemos compreender a dificuldade de operacionalização da epistemologia da prática na formação de professores. Mateus (2002, p. 11) reforça nossa compreensão ao assegurar que: [...] o novo paradigma que vem sendo apresentado para os cursos de formação dos professores ainda levará anos até que seja compreendido e aceito por um sistema educacional totalmente voltado ao racionalismo técnico, no qual a aquisição do conhecimento teórico deve servir ao aprimoramento da prática. Telles (2002) comunga tal pensamento, ao reconhecer as limitações de operacionalização da epistemologia da prática, denunciando a ausência generalizada de uma pedagogia da positividade e de um entendimento do professor detentor de conhecimentos práticos. Para tanto, aposta na pesquisa narrativa como processo emancipatório e como instrumento de acesso à subjetividade dos professores: A proposta da Pesquisa Narrativa é a de uma prática emancipatória de formação de professores. Tal prática abre espaços aos seus participantes para a construção de um auto-conhecimento, o conhecimento de sua subjetividade em relação direta com o conhecimento de sua própria prática profissional. Assim, ficam os professores em posição de agenciadores de suas próprias transformações; pois ninguém transforma ninguém. As pessoas se transformam em função de seus desejos.(TELLES, 2002, p.23) (grifos nossos) As reflexões de Telles sobre práticas investigativas que favoreçam o conhecimento da subjetividade encontram eco no questionamento de Barreiro e Gebran, (2006, p.28) de que, além da dimensão instrumental-cognitiva da ação docente, necessitamos compreender essa ação a partir de um terceiro elemento concernente às intenções e às escolhas do sujeito implicado nesta ação. Dito de outro modo, as autoras defendem que a ação docente transcende a concepção _________________________ ___________________________

Igarapé, v. 11, n. 1, 2018, p. 179-199. 190 restrita de um saber-fazer uma vez que pressupõe a mediação do sujeito. Este terceiro elemento reitera, pois, a subjetividade. Outros fatores que tornam a subjetividade indesejável, nas investigações sobre a formação de professores, referem-se (i) à dificuldade de lidar com a singularidade do sujeito, (ii) ao centramento da perspectiva social nas discussões sobre identidade mediante um “esquivar-se” da dimensão individual, e (iii) ao enfoque estritamente cronológico dado às discussões sobre a temporalidade não formação. Na contramão desses esquivamentos e restrições presentes na discussão da subjetividade no processo de formação de professores, Tardif (2002, p. 237) comenta o assunto asseverando que os professores são sujeitos do conhecimento e possuem saberes específicos ao seu ofício. Dessa forma, o autor caracteriza três grandes orientações que tratam da subjetividade dos professores (TARDIF, 2002, p.230-233). A primeira orientação, denominada cognição e pensamento dos professores, refere-se a pesquisas de abordagem psicológica ligadas à cognição. Tais pesquisas, porque apoiadas na visão cognitivista e psicologizante, reduzem a questão da subjetividade a uma racionalidade intelectual e instrumental. Na América do Norte, segundo Tardif (2002, p.231), o ensino é concebido como um processo de tratamento da informação e as investigações priorizam os processos mentais que regem o pensamento do professor. Nesse sentido, os saberes do professor são definidos como representações mentais a partir das quais os práticos ordenam suas práticas e executam suas ações (TARDIF, 2002, p.231); trata-se, portanto de saberes procedimentais e instrumentais que permitem o professor elaborar uma representação da ação e lhe dar forma. Na Europa, as pesquisas se orientam pelo viés construtivista e socioconstrutivista e se interessam pelos processos de negociação, de ajustamento e de estruturação das representações mentais subjetivas e intersubjetivas dos professores relacionados com o contexto de ensino, com as interações com os alunos e também com as outras dimensões simbólicas do _________________________ ___________________________
 Igarapé, v. 11, n. 1, 2018, p. 179-199. 191 ensino[...] (TARDIF, 2002, p.231). As pesquisas, desta feita, evidenciam o professor perito e eficiente. Na segunda orientação, aparecem as pesquisas de ordem fenomenológica que englobam temas como história de vida pessoal e profissional, crenças, a voz dos professores, enfoques narrativos, metáforas, relatos, dentre outros (cf.TARDIF, 2002, p. 232). O professor é considerado sujeito ativo de sua própria prática. Essa segunda orientação está inserida em uma visão existencialista cujo interesse voltase para o professor experiente com seus dilemas, tensões e rotinas. Por fim, a terceira orientação estende-se pelo campo da sociologia dos atores e da sociologia da ação. Esses campos de estudos estão associados: “[...] ao simbolismo interacionista, à etnometodologia, ao estudo da linguagem comum e cotidiana, ao estudo da comunicação e das interações comunicacionais, às competências sociais e aos saberes sociais dos atores, etc. “ (TARDIF, 2002, p.233). Dessa perspectiva, a subjetividade não se reduz à cognição ou à vivência pessoal, mas remete às categorias, regras e linguagens sociais que estruturam a experiência dos atores nos processo de comunicação e de interação cotidiana (TARDIF, 2002, p.233). As orientações expostas por Tardif promovem um redimensionamento no cenário das pesquisas em educação, ao deslocar a discussão sobre formação e subjetividade do âmbito racional-metodológico para o âmbito processual. Martins (2010), problematizando a formação inicial do professor de língua inglesa, compreende o estágio supervisionado enquanto um espaço de desenvolvimento de experiências pessoais e profissionais e, principalmente, de constituição de sentidos e de produção de saberes. Segundo a autora, a subjetividade do processo educacional ocorre a partir da relação de mediação entre a interioridade e a exterioridade do sujeito. Assim, Martins (2010) com base em Severino (2001, p.57) considera o estágio como uma prática simbólica pois diz respeito às ações dos professores em formação, seus conceitos e valores que dão sentido à prática e são socialmente construídos e historicamente consolidados. _________________________ ___________________________ Igarapé, v. 11, n. 1, 2018, p. 179-199. 192

 Nesse momento, parece necessário fazermos uma breve incursão por conceitos que nos auxiliem na compreensão sobre a docência e sua complexidade constitutiva, focalizando marcas da subjetividade no processo de tornar-se professor. Passemos, então a considerar alguns conceitos envolvidos neste estudo que nos auxilia a evidenciar essas marcas e aprofundar a discussão e a reflexão sobre a presença (sempre) da subjetividade no processo de formação inicial de professores. 2.1 Subjetividade: da identidade, da singularidade e da temporalidade do formar-se Embora este estudo não esteja inserido em uma abordagem narrativa de pesquisa e, portanto, não trilhe os caminhos para a realização de investigações sobre história de vida, buscamos respaldo em alguns pontos levantados por Josso para abordar questões ligadas à subjetividade do/no processo de formação de professores. Josso (2002, p.197) deixa transparecer a ideia de que a formação não pode ser tratada a partir de uma homogeneidade porque é constituída de vários aspectos. Primeiramente, remete a formação a um processo de aprendizagem de competências e de conhecimentos técnicos e simbólicos. Com base em correntes metodológicas5 atuais relativas à formação, apresenta o conceito de “impermanência” para designar a tomada de consciência mais primitiva que o eu pode fazer na observação/exploração de si mesmo e do seu meio humano e natural. A autora questiona a geografia de categorias descritivas para abordar a heterogeneidade dos grupos e propõe a singularidade6 como paradigma associado ao conceito de humano ao afirmar que: Esta singularidade, se formos sensíveis a ela em cada instante da nossa prática, impõe-se como a maior limitação da nossa atividade. Ela é tão radical que a fenomenologia do encontro nos faz descobrir, a cada instante, 5 Em particular da formação experiencial, a das histórias de vida em formação, bem como da pesquisa-formação. (cf. JOSSO, 2002, p.197) _
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 o mistério de cada ser e quebra o aparente pré-conhecimento que tínhamos por meio da integração das ciências do humano. (JOSSO, 2002 p.199) A singularidade, na visão da autora, remete à temporalidade no processo educativo. Esse posicionamento encontra amparo na própria definição de singularidade. Remetendo-nos ao conceito dicionarizado, Singular significa, de acordo com os verbetes um e dois, 1.pertencente ou relativo a um. 2. Especial. Raro. Na sequência, Singularidade é definida nos seguintes termos: 1.qualidade, estado ou condição do que é singular. 2. Ato ou dito singular. 3. Região do espaçotempo onde as leis da física atualmente conhecidas entram em colapso e as equações perdem o seu significado. Podemos entender, com base na ideia de colapso expressa no verbete três, as argumentações de Josso (2002, p.199) referentes à relação singularidadetemporalidade. A autora, por exemplo, postula que a gestão da temporalidade sociopedagógica, encarada pela perspectiva do professor/formador, choca-se com a gestão da temporalidade sócio-individual. Na oportunidade, a pesquisadora tece críticas às pedagogias cujos pressupostos apontam para um processo de aprendizagem de correspondência unívoca do tipo: o professor ensina, o aluno aprende. Ao contrário, propõe a noção de autopoeisis para subsidiar as investigações sobre o ser aprendiz que é considerado ser autopoiético, e entendendo o ato educativo como violador da temporalidade autopoiética. A autora, então, se autoquestiona: [...] visto que só o aprendiz pode aprender a aprender, qual é o meu lugar, o meu papel, o meu estatuto, a minha missão de professor, formador, educador junto a ele? (JOSSO, 2002, p.200) A reflexão da autora reforça a ideia de que o tempo do processo de aprendizagem é condicionado pela singularidade de cada aprendiz. A mudança só ocorre mediante uma tomada de consciência e mesmo assim, Josso (2002, p.202) insiste na não equivalência entre a temporalidade da aprendizagem e a temporalidade da mudança. _________________________ ___________________________

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 Se a formação envolve um processo de mudança, Josso (2002, p.203), detendo-se um pouco mais sobre a temporalidade e singularidade, chama atenção para o fato de que o processo de formação é posto entre parêntesis, fora do campo da consciência, para se ocupar do que é mais urgente aqui e agora. A autora continua sua reflexão [...] o aqui e agora é apenas o local de uma experiência obrigatória, suportada nos seus constrangimentos, mas não integrada numa prospectiva, não integrada como material de exploração, não integrada como experiência formadora de mudanças, não subordinada a um sentido para o indivíduo, não subordinada a uma procura, a uma orientação autoformulada a partir do seu patrimônio sociocultural. (JOSSO, 2000, p.204) Essa ponderação nos auxilia a explicar o porquê da experiência do estágio, nos programas de formação, funcionar, não raro, como uma atividade protocolar e esvaziada de sentido. Ao contrário, quando pensado como espaço para a subjetividade, o estágio pode se converter em uma experiência significativa na formação. Retomando a relação singularidade-temporalidade, Josso (2000, p.204) argumenta: O respeito pelo tempo concedido à simbolização, à integração num imaginário, apresenta-se, então, como respeito à pessoa reconhecida na sua singularidade, quer dizer, nas diferentes dimensões do seu ser (as suas identidades) associadas a uma subjetividade impermanente [....]. A pesquisadora concebe a formação como uma construção de si e de sentido mediada pela temporalidade biográfica e chama a atenção para a conscientização da complexidade temporal da formação. Josso (cf. 2000, p. 223) ainda menciona o trabalho intersubjetivo no processo de formação que encerra as identificações e diferenciações que o indivíduo faz durante o seu processo de estranheza do outro e de si mesmo.

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 Aproveitamos as contribuições de Josso para abordar a subjetividade do/no processo de formação do professor de língua inglesa sob a perspectiva da impermanência, da singularidade e da temporalidade. A ideia de impermanência nos permite identificar a situação de intensa transitoriedade do futuro professor devido ao fato da experiência do estágio ir à contramão da estabilização de sentimentos, de práticas discursivas, de ações e reações. Longe de estabelecer uma identidade una, fixa e duradoura, as experiências do estágio são palco para a impermanência e, portanto, para a desestabilização das certezas, das verdades. A própria condição de estagiário assenta-se na intersecção do sujeito-aluno com o sujeito-professor. A noção de singularidade, da mesma forma, nos autoriza a definir, neste estudo, o professor em formação como um sujeito singular que se constrói ao vivenciar as experiências proporcionadas pelo estágio supervisionado. O estágio, assim, configura-se como um tempo–espaço de produção da singularidade do futuro professor. Em outras palavras, funciona como ambiente produtor de contradições, de conflitos, de sentidos e significados. A ideia de temporalidade se agrega a este estudo na medida em que compreendemos o estágio supervisionado como momento de passagem do ser aluno para o ser professor. Momento este marcado por experiências passadas e presentes que diferem de sujeito para sujeito, configurando-se, portanto, em um tempo singular do tornar-se professor. Esse tornar-se professor, durante o estágio supervisionado, aparece em Nóvoa (1995, p.16) ligado à noção de processo identitário pela maneira como cada um se sente e si diz professor, dando-nos pistas sobre o eu pessoal e profissional. Essa apropriação da história pessoal e profissional, para o autor, é um processo complexo e não cumulativo (de cursos, conhecimentos e técnicas) que exige um trabalho constante de reflexão sobre as práticas e de construção de uma identidade pessoal (NÓVOA, 1995, p.16). Para dar conta de identificar traços da identidade profissional, Nóvoa (1995, p.16) descreve três atitudes que fundamentam o processo identitário do professor: _________________________ ___________________________

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 adesão, ação, autoconsciência. Após caracterizar as atitudes do seu triplo AAA, o autor enfatiza a identidade profissional dos professores como um lugar de lutas e de conflitos, como um espaço de construção de uma maneira de ser e de estar na profissão (NÓVOA, 1995, p.16). . Esse contexto de conflitos e de lutas no processo de formação tem como protagonista a própria descontinuidade do sujeito. Hall (2005, p.13-14) nos ajuda a compreender essa descontinuidade, afirmando que o sujeito assume identidades diferentes em diferentes momentos, identidades que não são identificadas ao redor de um “eu” coerente. Nessa perspectiva o sujeito é sócio-histórico e habitado pelo desejo por isso não tem o controle sobre si e sobre o que diz. Nesse sentido, o conceito de identificação nos permiti entender as identidades (e não a identidade) como pontos de apego temporário às posições-de-sujeito que as práticas discursivas constroem para nós (HALL, 2000, p.112). Neste estudo, o conceito de identidade pressupõe o de identificação tendo em vista que discutimos a descontinuidade dos processos identitários do professor de língua inglesa em formação por ocasião do estágio supervisionado. BREVES CONSIDERAÇÕES Considerando, pois, a presença marcante da subjetividade no processo de formação, propomos um traçado sócio-histórico a partir dos conceitos de processo identitário e trabalho intersubjeitvo para dar vez e voz a subjetividade dos professores em formação. Professores em formação saem de seus mundos com suas histórias, suas culturas, suas vivências. Isso não pode ser desconsiderado em contexto de formação de professores. Portanto, acreditamos que é preciso reforçar a necessidade de prestar atenção aos conceitos de subjetividade como processo identitário, marcado pela singularidade e pela temporalidade biográfica do sujeito, isto é, enquanto uma produção sócio-histórica , e de linguagem como uma dimensão discursiva. Nosso _________________________ ___________________________ Igarapé, v. 11, n. 1, 2018, p. 179-199. 197 argumento é que não se pode medir tudo por dados, por medidas mecânicas, em número. . Há muito mais dados que devem ser considerados e que não são mensuráveis. Como diria o personagem narrador de Pauline Melville em The Ventriloquist´s Tale, “a vida de uma pessoa não está pendurada entre duas datas como uma rede que fica pendurada entre duas árvores .” Há muito mais na vida de um ser humano. Quando promovemos discussões sobre ensino e aprendizagem de uma língua estrangeira e quando discutimos questões de formação do professor nesta área, estas reflexões, acreditamos, são muito relevantes Nesse contexto, não é difícil de lembrar, por exemplo o que acontece com a personagem de Bernard Shaw em Pygmalion (1966): o professor de fonética acredita apenas em conceitos de cientificismo obejtivista , como por exemplo a “fala visível”, e usa todo o material e recursos para dominar a fonética de sua aluna, Eliza Dolittle. Para o professor cientista, positivista a aluna é um objeto reduzida a um material de observação para fazê-la uma menina “ladilike. O cientificismo de Higgins’ ignora qualquer particularidade de Dolittle, seu contexto social, sua história e experiência. Quando um professor de inglês diz a seus alunos que para aprender inglês é necessário “pensar em inglês” para aprender a língua ele está restringindo a aprendizagem ao cartesianismo ou racional. Cada sujeito é um sujeito. Para promover aprendizagem do novo, é necessário respeitar as particularidades do local, a língua de um determinado de um professor em formação ou de uma determinada comunidade, suas crenças , história e cultura. Assim se oportunizam-se novas formas de falar e de ver o mundo e de ensinar. Não queremos sugerir que é necessário uma subjetividade total ou apenas magia na formação de professores, mas sim que não devemos privilegiar um e negligenciar outro. O cartesianismo pode ser prejudicial quando não ponderamos questões do “não universal” quando desprezamos as particularidades de cada professor em formação, de cada aprendiz Pensamos que é importante refletir sobre o perigo de “rotular , de criar fórmulas válidas para todos os contextos, homogeneizando e objetificando o outro. _________________________ ___________________________



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 REFERÊNCIAS

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ASHCROFT, B. Post-colonial Transformation. London and New York: Routldege, 2002
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BACHELARD, G. O. O novo Espírito Científico (New Scientific Spirit). In R. F. Kuhnem (Ed.), Os pensadores (The Thinkers) (pp. 89-179). São Paulo, 1978.
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_ Igarapé, v. 11, n. 1, 2018, p. 179-199. 199

(Conflicts and contradictions in the education of teachers: A study on the discourse on English Teacher training) (Master’s thesis, UNICAMP), 1998 _______________ Estágio Supervisionado: prática simbólica e experiência inaugural da docência. Tese de doutorado em Educação Escolar Un

A graça da garça



                        ( para Leia Maia que fotografou a garça no lago)



Oh, a garça
não disfarça
sua graça.
Esperta
espreita
o peixe.
Sua pesca
ou caça...

Sei porém
que a garça
elegante
 para o peixe
é  uma farsa.

..........
O que para uns
é só  graça
para outros:
uma ameaça...


Miguel Nenevé --observando a garça a observar o peixe na água...)