Miguel Nenevé e Rose
Siepamann
El mestizaje de los
pueblos indígenas con los colonos españoles y los
otros países, la
fusion del catolicismo con elementos de las religiones
nativas, el
intercambio de costumbres y tadiciones,
asi como otros
muchos tipos de
interacion y sincretismo cultural, hacieron de |Mexico
un pais marcadamente
diferente de las regiones colonizadas pelos
europeus en la parte
setentrional del continente americano,e
incluso
las demás republicas
latinoamericanas (L D Taylor, 2001 p 67)
Os povos de Santa Rita
não gostavam de ser chamados de
Mexicanos.
Eles tinham ouvido
histórias de como esta terra foi Espanha.
Eles tinham ouvido
sobre Ornate que ocupou os terrenos do Nuevo
Mexico em 1598. Para
muitos não importa que Ornate era
um conquistador bruto
que punia os Acoma cortando seus pés e
cauterizando as
feridas com água fervente. (Abeyta, 140-1)
Aaron Abeyta é um poeta e escritor
de ficção que nasceu no sul do estado de Colorado, mais precisamente na cidade
de San Louis Valley. Já ganhou prêmios por sua poesia e por sua ficção. Os seus escritos são
interessantes não somente pela maneira poética de escrever e pelo hibridismo da
linguagem ao misturar espanhol com inglês, mas também pelo seu tema de
resistência cultural e por revelar um visível esforço para manter a memória de
seu povo hibrido vivendo nos Estados
Unidos. Sua literatura pode se encaixar na literatura chamada “chicana” pois
propõe discussões sobre americanos de origem mexicana ou hispânica que
enfrentam sentimentos de deslocações no poderoso país da América do Norte. Como um conjunto distinto de escrita a
literatura chicana é relativamente nova e de definição ou delimitação não tão
fácil. Neste artigo nos propomos analisar a obra de Aaron Abeyta, Rise, do not
be afraid, ( Levante-se , não tenha Medo) dentro do conceito de Literatura
Chicana
Embora o conceito e a classificação
de literatura chicana não sejam bem
definidos, podemos dizer que o verdadeiro início desta literatura se deu já no
século dezesseis quando os conquistadores
espanhóis começaram a colonização da América. As narrativas de Cabeça de Vaca,
de Niza e Castañeda revelam os tempos da “conquista” com “bravura” e
entusiasmo. Vindo para a América durante a época chamada “Era Dourada” tempo de
Miguel de Cervantes e de Lope de La Vega, os conquistadores com certeza tinham
os narradores para contar ao mundo as novidades do Novo Continente, como
informa Márcio Souza em História da Amazônia (2001). Estes narradores eram
ávidos contadores de história, sempre favorecendo o surgimento de lendas,
contos extraordinários e canções. Por exemplo 1598, Juan de Orate e um grupo de
mais quinhentos homens celebraram a conquista do local que hoje é New Mexico (Estados Unidos) com apresentação
dramática composta para a ocasião. Há uma publicação de Gaspar Pérez de Villagrá, Historia de la
Nueva México feita em cantos. Este, segundo alguns historiadores da literatura
chicana, poderia fazer parte dos primeiros textos produzidos na América do
Norte por Espanhóis.
No entanto, para se ler sob uma perspectiva mais política, a literatura
chicana pode ser considerada muito mais recente. Como afirmamos anteriormente,
é uma literatura de definição difícil, mas poder-se-ia dizer de um modo bem
simples que é a literatura proveniente da cultura de povos mexicanos (ou outros
países da América Latina) que se mudaram para os Estados Unidos , como também
no caso de hoje de pessoas nascidas nos Estados Unidos mas cujos ascendentes,
pais , avós ou bisavós são provenientes
do México. É o que acontece muito em Texas, Arizona, Califórnia, New Mexico, e
Colorado entre outros. Neste contexto,
as pessoas enfrentaram problemas linguísticos e
culturais
vivendo como minorias nos Estados Unidos . É bom lembrar que os porto-riquenhos
, que não migraram, mas foram anexados aos Estados Unidos também são
considerados chicanos Questões de hibridismo, mestiçagem e deslocamento sempre
são considerados quando se discutem literatura chicana.
Assim, podemos dizer que a literatura
Chicana, ou às vezes chamada de “Mexican American” pode incluir temas de estudos culturais como por exemplo, identidade étnica ao apresentar
a personagem chicana, muitas vezes com uma língua “quebrada” inglês com
vocábulos em espanhol, costumes, comida e tradições com raízes na América
espanhola. O crítico literário Ramón
Saldívar afirma que , "diferente de muitos outros grupos étnicos que
migraram para o Estados Unidos, mas semelhantes ao indígenas americanos, os
chicanos se tornaram uma minoria pela conquista de sua terra natal. (13) Ao
longo dos anos, os Chicanos desenvolveram uma cultura própria que na realidade
não pertence nem à América espanhola nem aos Estados Unidos. Restou então uma
cultura híbrida entre México (ou América hispânica) e Estados Unidos, um
produto de ambos, mas diferente. Segundo Paredes (1995) , até 1900, a
literatura chicana apareceu como uma parte distinta da Literatura Americana. O
autor menciona a importante obra de
Josephina Niggli , Mexican Village (1945) como um marco importante para
esta literatura.
Como vimos argumentando, os temas
mais comuns explorados nesta literatura, sem duvida são aqueles relacionados
com identidade, a cultura relacionada à
língua, a discriminação, a memória e a história. Todos estes temas, de certa
forma, passam pela questão da comunicação pela linguagem. A identidade, a
cultura, a história e a memória não podem negar a linguagem, a questão de
experimentar uma hibridarem linguística e cultural.. A comunicação cria a cultura e a cultura por
meio da tradução oral é o meio de comunicação, a linguagem carrega a cultura e
a cultura traz consigo todo o conjunto de valores, de expressões, de visões do
mundo, da percepção e interpretação do espaço, Desta forma que esta literatura
chicana pode e deve ser um. veículo de descolonização, uma vez que por meio
delas os chicanos podem se expressar e mostrar a voz que de certa forma tem sido
negligenciada. É muitas vezes uma
crítica e um protesto `a maneira que vivem os chicanos nos Estados Unidos. Pode
ser também, como diz Abeyta, uma forma
de redenção de vidas sofridas, uma redenção da história e da cultura. Ao lembrar o sofrimento de seus antepassados
que tiveram que trocar seus nomes, abandonar a sua cultura para poder
sobreviver nos Estados Unidos, o autor de forma convida o leitor para lembrar a
carga de colonialismo sofrida.
Outros temas presentes na literatura
chicana também se incluem nos estudos pós-coloniais. Como exemplo, temos a
questão da a migração, da situação de
viver entre espaços, deslocados, nas fronteiras, nas margens. Os textos na
maioria são escritos em inglês com mistura de espanhol, mas há também textos em
espanhol ou bilíngues como é o caso de And the earth did not devour him de
Tomas Rivera (1990)
Levante-se, não tenha Medo, no original Rise, Do Not Be Afraid
(publicado e premiado em 2011)
reflete muito este mundo chicano. A obra
é uma exploração poética de uma pequena cidade, Santa Rita, que
fica em New Mexico, fazendo fronteira com o estado de Colorado. Para expressar o sentimento de
deslocamento o autor recheou o livro de
palavras ou expressões hispânicas que revelam este mundo hibrido chicano.
Palavras muitas vezes ligadas à afetividade como abuelita, tia, tio, papá, la
palomina e assim por diante.
Como se sabe, não
é incomum caminhar pelas ruas dos Estados Unidos, não somente de Texas,
Califórnia e New Mexico para ouvir espanhol ou expressões em espanhol quando se
fala inglês.. Usam-se muitos termos e expressões em língua espanhola que certa
forma marcam a identidade. Como por exemplo, atender o telefone e fala-se
“bueno”, depois seguir falando em inglês. O que se tem é mundo
nem o “americano” no sentido
dos descendentes do Mayflower, nem o mexicano: é um estar entre estas
identidades.
Como outros cenários da literatura chicana, Santa Rita, onde baseia-se o livro, sofre pela decadência, pelo desaparecimento da tradição, das pessoas que saem para centros maiores. A tristeza parece ter marcado o território:
Dos
três, dois tem nomes e um é conhecido apenas por Deus. Os dois
com
nome estão enterrados juntos embaixo do cedro na terra de seu
que
seu abueltio comprou de uma mulher chamada Lara. Como os dois
dos
três que ele nunca imaginou ou conheceu, ele também não conhecia
Lara,
mas brincava na sua casa assombrada...(p. 13, trad. nossa)
O próprio autor diz que o livro é sobre o esforço da
comunidade e de seu povo na tentativa de encontrar redenção e sentido no perda
constante que vêm sofrendo. Apesar destas perdas, as personagens do livro
buscam a salvação na única coisa que
conhecem: fé e natureza”. Aaron Abeyta, que ensina Literatura chicana e Literaturas de minorias,
parece acreditar que escrever ajuda a ensinar porque é necessário fazer uma
conexão entre escrever e ler. Sua obra revela que a linguagem é um meio de
comunicação que de certa forma espelha , ou reflete a identidade de um povo e
sem dúvida é parte integrante da cultura. Neste sentido ele reflete o que o
autor queniano, Ngugi Wa Thiongo defende
ao referir-se a linguagem como “alma da cultura “: “ A linguagem é inseparável de nós mesmos
como comunidade de seres humanos com uma forma e um caráter específicos, um
história específica e uma forma de ver o mundo específica. (2006, p 156) Uma
reflexão bem interessante é apresentada no segundo capítulo da obra de Abeyta
cujo título é “Como a palavra deveria se levantar”.O autor poeticamente reflete
: “A palavra deveria vir como água subindo, às vezes mansamente como as notas de um violino tocadas por uma menina em pé em
um elevado, sua canção suave e
granulada flutuando sobre um campo de grama aberto. A palavra deveria vir como a neve caindo pela primeira
vez” (17)
No mundo de Santa Rita, porém, as coisas não se
desenvolvem assim com toda esta suavidade uma vez que anunciam a morte de Ramon
Fernandez. E Ramon Fernandez nem sempre fora ninguém. “As mulheres de Santa Rita
lembram que ele dançava bem. Ele carregava um rosário de madeira em seu bolso e
uma faca no outro. Ramon Fernandez antes de ser ninguém era como as pessoas de
Santa Rita, rico, sem ter dinheiro” (18)
A cultura particular do povo chicano vai sendo revelada,
desenvolvida poeticamente no livro. Alguns provérbios e ditadas da cultura
revelam o saber do povo. Por exemplo, os grilos cantam selvagemente antes de
partir para fugir do frio. Nesta mesma forma de revelar a cultura chicana, o
livro sugere que o conhecimento de como
fazer tortilha deve ser passado de geração a geração para que não se perca:
“existem cinco ingredientes para fazer tortilha. Muitas vezes as pessoas pensam
que é apenas um” (20) e os ingredientes devem ser dos mesmos que a abuelita usava.
A mesma farinha, o mesmo sal etc. Um ingrediente que é “esquecido lembra “o indígena em nós, é pequeno mas não menos
importante.” (21)
A linguagem está intimamente ligada com a prática da
comunidade, com o trabalho, a culinária entre muitos outros aspectos. A perda
da linguagem e até do nome próprio de certa forma vão desterritorializando as
personagens do local. Se a linguagem é um marcador importante da linguagem, o
fato de ter que receber outro nome significa ter que deixar outra identidade
entrar em suas veia. A perda da linguagem ou a falta de controle pode
significar que a pessoa não participa completamente da comunidade. Para Ngugi,
por exemplo trocar de nome pode significar tirar a identidade de alguém.
Parece que é o que acontece
com as crianças que tem que deixar Santa Rita para estudar: “A escola é muito diferente aqui. As freiras
são legais, mas elas me chamam de Nancy. Uma delas disse-me que eu nunca seria
alguém com um nome como Nonnatusia. ...Ela renomeou todos. Eu sou Nancy, Pedro
é Pete, Jaime é James, Perla é Pearl “
(84-85)
Interessante observar que a obra de Abeyta ajuda a
refletir sobre a condição dos “Hispânicos” e de sua situação nos Estados
Unidos. Neste caso, o povo de Santa Rita
reflete as circunstâncias em que vivem as pessoas de origem hispânicas dos mais
diversos locais, inclusive os porto-riquenhos que foram “absorvidos” durante a
expansão americana.
A depressão econômica, a decadência do local vivida e
sofrida e a necessidade de deixar o local, tudo parece trazer um sentido de
perda: “ Santa Rita também iria “desaparecer em pequenos pedaços, como uma
terra gelada numa pá. Santa Rita iria desaparecer devagar e poucos entenderiam
sua perda. Santa Rita morreria, mas há pedaços dela com seu povo. Poucos
saberiam como a cidade foi carregada com eles.“ (61)
A esperança porém está na memória. As pessoas que
carregam a pequena cidade em suas recordações podem cantá-la mais tarde. Se uma
criança que nascer no futuro não souber da cidade, “nós escrevemos isso..para
que a criança nascida anos mais tarde tenha um marcador, “ uma forma de
conhecer e de saber o caminho da casa “durante uma tempestade ou no crepúsculo”
(160)
Abeyta admite que o
que ele escreve não é exatamente um romance , mas uma narrativa poética.
Primeiro escreve um longo poema, para depois desenvolver a narrativa. Na
realidade os próprios poemas são narrativas. O que é interessante nesta
discussão para nosso argumento é o convite para olhar e repensar o mundo
chicano, as características de um povo que vê sua cultura, sua cidade, seu modo
de vida, sua linguagem e até seus nomes desaparecendo. Este é o mundo de Santa
Rita, na fronteira entre os Estados de Novo México e Colorado, um mundo que de
certa forma “se despedaça” como o mundo de Chinua Achebe no livo Things Fall
Apart (1980).
Achebe, Things Fall Apart.
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